O futuro é, sim, hoje

O que leva muitos a exigirem a realização imediata de uma visão de futuro? A incoerência estaria na demanda ou em outro lugar?

Oscar Motomura

Em determinadas épocas, muitas organizações fazem seus planos para o ano seguinte. Outras, porém, querem ir além. Querem planejar anos à frente, enxergar o
caminho de longo prazo. E até fazem exercícios para formular uma visão do futuro que gostariam de realizar. Eu gostaria de analisar uma faceta sutil da conexão entre a visão e sua efetiva realização, algo que intriga muitos líderes.

Não raramente, no momento em que uma visão de futuro é criada e divulgada, muitos já começam a cobrar de imediato o que nela está expresso. Embora esteja claro – pelo menos nos esforços de comunicação – que visão é onde a empresa quer estar no futuro e, portanto, ainda está por ser realizada, a cobrança é para agora. “A empresa não é isso…” é a reação típica.

Uma explicação comum – e simplista – para essa contradição é a de que muitas pessoas, principalmente aquelas envolvidas em atividades mais operacionais da
companhia, não teriam uma capacidade conceitual muito desenvolvida. Não conseguiriam, portanto, compreender que a visão é aquilo que cabe ao grupo construir nos anos à frente e não algo que deveria existir hoje. Mas uma reflexão mais profunda sobre esse aparente paradoxo pode nos fazer perceber algo mais sutil, mas de extrema importância. Quando as pessoas “cobram” o estado futuro já, realizado hoje, elas desejam – muitas vezes até intuitivamente e não no plano do raciocínio lógico-racional – simplesmente coerência. Esperam, acertadamente, que se a visão de futuro expressa efetivamente a intenção da cúpula, as atitudes e ações dos líderes devem ser coerentes com ela. Desde já.

 

Transformar o projeto de futuro em realidade toma tempo. As ações para chegar lá devem começar agora.

 

Por exemplo: se um dos pontos da visão de futuro é que “seremos a melhor empresa para se trabalhar” (com base na premissa de que conquistar essa condição será essencial para assegurar talentos que enfrentem com genialidade qualquer desafio futuro), a atitude de todos – principalmente dos líderes – deveria ser de forte coerência em relação a essa visão. Ou seja, se hoje há chefes que tratam mal as pessoas, isso teria de ser trabalhado desde já, não no futuro. Caso contrário, as pessoas que formam as equipes desses chefes considerarão a própria visão inválida.

Sim, a visão é de futuro, claro… Mas ela revela uma intenção. Que deve estar refletida em tudo o que se faz no presente. Daí a cobrança, se não sobre as pessoas com comportamentos não alinhados à visão (“um dia esses chefes chegarão lá”) certamente sobre os líderes que a querem realizada (“deveriam imediatamente fazer algo a respeito desses chefes”).

Do mesmo modo, se o ponto mais relevante da visão de futuro é “tornar a empresa a mais inovadora do país”, a cobrança será por uma atitude pró-inovação e de muita abertura para ideias “diferentes”, por exemplo. No futuro? Não. Desde já. O estado almejado é futuro. Mas a atitude que levará a esse futuro é trem de ser expressada agora. Nesse sentido, a cobrança por coerência desde já é absolutamente válida. Nesse sentido, o futuro é, certamente, hoje.

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